“Estou em uma cadeira de rodas por causa da poliomielite”, diz mineira que contraiu a doença na infância

Perto do fim da campanha de vacinação, bancária que convive com sequelas da pólio desde o primeiro ano de vida reforça a importância de vacinar as crianças

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“É um processo rápido. Eu andava quando o vírus atingiu meu corpo. Parei de andar em três dias e não falava mais. Quando adoeci, eu já não usava fraldas, comia sozinha. Regredi com o desenvolvimento infantil para um bebê de dias”. A fala é da bancária Lecir Andréia Martins Magalhães. A belo-horizontina de 48 anos, mãe de um filho, teve poliomielite em 1975, poucos meses antes de completar dois anos de idade. “Estou em uma cadeira de rodas por causa da pólio”, diz. Perto do fim da campanha nacional de vacinação, ela aconselha as famílias a imunizar as crianças contra a doença, que pode até matar.

Na época em que Lecir foi contaminada pelo vírus, a vacina contra a poliomielite ainda não era difundida no Brasil e não havia campanhas de imunização. O país registrou muitos casos da doença ao longo da década de 1970 e, naquela época, ainda houve uma epidemia de meningite. Ela acredita que a semelhança entre os sintomas pode ter contribuído para dificultar o diagnóstico.




“Tive uma febre alta que foi confundida com uma gripe. De início, os médicos não sabiam identificar que era pólio. Logo ocorreu a paralisia. Me punham em pé e eu caía. Dentro de um mês eu perdi todos os movimentos. Ela parou na altura da nuca, por isso não tenho paralisia cerebral. Eu tenho uma lesão alta, da nuca para baixo. Ela vai afetar os braços e pernas. Tenho movimentos dos braços, não uma força completa, e nenhum nas pernas. Uso cadeira de rodas e nunca mais andei”, conta.

O tratamento de Lecir foi realizado na rede pública. Ela conta que passou por internações constantes até os 12 anos e, ao longo da vida, precisou passar por 13 cirurgias, a primeira quando tinha apenas 5 anos. “Passava meses engessada. E muita dor, porque eu sinto as pernas. A pólio atrofia os membros. É difícil ao longo da vida”, explica.




Desafios

Lecir contou com o apoio da família e de outras pessoas para ter uma vida com independência. “Foram longos anos de fisioterapia. Estudei em uma escola especializada primeiro, na Associação Mineira de Reabilitação (AMR), e fiquei lá até os 15 anos. Depois disso fui para uma escola pública, onde me formei primeiro em magistério. Mais tarde fui efetivada no Banco do Brasil, passei no concurso, e estudei a faculdade”. A bancária cursou administração e é pós-graduada em gestão de pessoas.




Foram vários desafios, segundo ela. “Eu adquiri equilíbrio de tronco. Consigo fazer transferências da cadeira para a cama, para o carro. Foi tudo ao longo da vida que fui desenvolvendo. Tenho mais de 24 anos de carteira. Dirijo um carro adaptado. Faço uso de cadeira motorizada, mas ao longo da minha vida usei uma cadeira normal, não tinha condições. É muita luta, não é fácil”, pontua.

Além disso, questões do dia-a-dia se tornam mais complexas. Lecir cita problemas de acessibilidade nas ruas, dificuldade para adquirir tecnologias que facilitam a vida das pessoas com deficiência, e a inserção no mercado de trabalho.




“Vacinar é um ato de amor”

Minas Gerais não registra casos de poliomielite pelo poliovírus selvagem desde 1985. O último caso no Brasil foi registrado em 1989 e, em 1994, o país recebeu o certificado de área livre de circulação do vírus. Até que a doença seja erradicada do planeta, ainda há risco de casos importados, que podem fazer o vírus voltar a circular nos territórios.




A meta de cobertura da vacinação contra a poliomielite é de 95%, conforme o Ministério da Saúde. Em Minas Gerais, segundo dados atualizados do painel da pasta na quinta-feira (20/10), 80% do público alvo foi imunizado. Esta é a segunda vez que a campanha de vacinação é prorrogada.

Diante do cenário, Lecir Magalhães pede que as pessoas se conscientizem a respeito da doença para evitar que ela volte ao país. “Vacinar é um ato de amor. Você vai prevenir que seu filho tenha uma doença que é difícil. É uma vida difícil, de renúncia, é uma vida cara. É uma vida na qual você precisa ter assistência e, muitas vezes, não encontra”, diz.




“Quando você vê uma pessoa na cadeira de rodas, você não sabe porque ela está ali, como ela vive, o que acarretou aquilo. Estou aqui para contar a minha história, que poderia ter sido diferente se tivesse conseguido me vacinar”, afirma Lecir. “Pais, responsáveis por crianças, vamos vacinar. Até dia 24 de outubro, pode procurar o posto mais próximo da sua residência. Vacine seu filho, seu vizinho, seu afilhado. Nós temos que acreditar na ciência. Eu sou a prova do que deu errado. Eu não pude me vacinar, mas meu filho é vacinado, meus irmãos são vacinados. Acredito que a gente precisa ter essa consciência. Precisamos ter este ato de amor”, conclui.

Dia Mundial de Combate à Poliomielite




Na próxima segunda-feira (24/10), último dia da campanha, é celebrado o Dia Mundial de Combate à Poliomielite, destaca o secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, o médico Fábio Baccheretti. Ele orienta que as pessoas procurem os postos de saúde para imunizar as crianças e não deixem a proteção de lado.

“Não podemos correr o risco de ter essa doença de volta. Já melhoramos nossa vacinação, mas ainda estamos longe dos 95% que é a nossa meta. Por isso é importante que pais, responsáveis, todos levem seus filhos que não forem vacinados. E quem ainda não tomou essa vacina, olhe a caderneta de vacinação e mantenha ela em dia. Só assim não vamos correr o risco de ter essa doença tão devastadora de volta correndo na população”, enfatiza.




A doença

A poliomielite é uma doença contagiosa que, por meio do contato direto com fezes ou com secreções eliminadas pela boca de pessoas infectadas, pode contaminar crianças e adultos. Não há tratamento específico para a pólio. Os sintomas iniciais são febre, fadiga, dor de cabeça, vômitos, rigidez do pescoço e dor nos membros. Aproximadamente 1% das infecções resulta em paralisia flácida, de início súbito e que afeta, geralmente, um dos membros inferiores. A doença também pode levar ao óbito.




Quem deve se vacinar

A vacinação é o único caminho para manter a proteção das crianças contra a poliomielite, eliminada no Brasil desde 1994. Existem duas vacinas disponíveis na rotina dos serviços de saúde: a vacina inativada poliomielite (VIP), que é injetável; e a vacina oral poliomielite (VOP).

A vacina contra a poliomielite é gratuita e está disponível nos postos de saúde de todo o país ao longo do ano. O esquema vacinal é composto por três doses injetáveis no primeiro ano da criança, aplicadas aos 2, 4 e 6 meses de vida, com intervalo de 60 dias entre as doses.

Depois, aos 15 meses de idade, deve ser administrada a primeira dose de reforço. O segundo reforço deverá acontecer aos 4 anos de idade. Para essas duas doses, é realizada a administração de duas gotas, exclusivamente pela via oral.

Benefícios

O Ministério da Saúde ressalta que, além de proteger contra doenças imunopreveníveis, a atualização da situação vacinal tem outros benefícios, como evitar a ocorrência de surtos e hospitalizações, sequelas, tratamentos de reabilitação e óbitos.

Em 1961 ocorreu a introdução da vacina contra a poliomielite oral no Brasil, com a realização de vacinações em municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro. Em 1980 foi estabelecida a estratégia dos dias nacionais de vacinação contra a poliomielite, realizados, em 14 de junho e 16 de agosto, produzindo impacto imediato, com drástica redução do número de casos da doença em sequência à introdução da vacinação em massa em um único dia.

Em 1986 foi criado o Zé Gotinha, marca-símbolo da erradicação da poliomielite, figura bastante conhecida na saúde pública brasileira. Desde então, o personagem aparece em todas as campanhas de Imunização e, atualmente, é símbolo do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Fonte: SES-MG

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